Falar sobre Allah sem conhecimento
(...) Al-Qurtubee em seu tafseer, fala sobre aquelas pessoas que dizem que quando lêem o Alcorão com a minha mente, ou que vem à minha mente, ou o meu coração me diz isto, ele conclui que quem lê o Alcorão e diz "pergunte ao seu coração", ou "meu coração me diz", e assim por diante, está falando de Allah sem conhecimento ('ilm), o que, conforme explicaremos, é um dos maiores pecados que podemos cometer e que, na verdade, essas pessoas são zanaadiqa, aquelas que não têm nada a ver com o Islam, e ele disse que elas devem ser mortas por apostasia (murtadin). (...)
Quando pegamos o Alcorão e lemos um versículo e o explicamos sem ter o conhecimento adequado, sem seguir uma metodologia adequada, na verdade, poderíamos estar, e só Allah (swt) sabe, seguindo o nosso próprio hawaa, seguindo nossos próprios desejos, seguindo uma inspiração de Shaytan, seguindo um dhann (conjectura), de que fala Allah (swt) em várias partes do Alcorão ou, então, poderia ser realmente uma espécie de inspiração de Allah (swt), mas o mais provável é que não seja esta última hipótese. E, por que não se trata desta última hipótese? Porque, conforme explicaremos mais adiante, não foi adotada uma metodologia própria de falar sobre o Alcorão e se não foi seguida essa metodologia então o pecado já foi cometido. Falar sobre o Alcorão sem conhecimento adequado, dando sua interpretação, sem conhecimento, sem conhecer os antecedentes, sem estar qualificado para isto, então o pecado já foi cometido. E, uma vez que a pessoa está cometendo um pecado, é pouco provável que Allah (swt) a abençoe pelo pecado de dar a interpretação correta do Alcorão.
Quando dizemos que Allah (swt) quer dizer isto ou aquilo em um determinado versículo, na verdade estamos falando ou dizendo alguma coisa em nome de Allah (swt), falando sobre Ele (swt), e se estivermos falando sem conhecimento, sem 'ilm, este é um dos maiores pecados que podemos cometer.
Ibn ul Qayyim disse que é o maior pecado. Ele disse que falar de Allah (swt) sem 'ilm, é o maior pecado que podemos cometer. E ele se baseia no seguinte versículo:
"Qul innamaa 7arrama Rabbi-l-fawaa7isha maa DHahara minhaa wa maa baTan, wal-ithma wal-baghya bi ghayri-l-7aqq, wa an tushrikoo bi-Llaahi maa lam yunazzil bihi sulTaanaa, wa an taqoolo 3ala-l-Laahi maa laa ta3lamoon."
"Dize: As coisas que meu Senhor proibiu são al-Fawaahishah (obscenidades, todos os tipos de relações sexuais ilícitas, etc), sejam manifestas ou secretas, pecados (de todos os tipos), opressão injusta, associar parceiros (na adoração) a Allah, porque Ele jamais deu autoridade para dizer coisas sobre Allah de que não se tem conhecimento." (7:33)
Ao discutir este versículo, ele diz, antes de mais nada, que existem alguns pecados que são haraam li-dhaatihi, proibidos por causa de sua natureza maléfica, e (outros que são) haraam li ghairihi, que são proibidos porque levam a algum mal ou trazem em si o mal.
E ele disse, com relação a este versículo, todos os quatro são haraam in dhaatihi, são haraam em sua essência por causa do mal inerente a eles. Continuando com sua discussão, ele disse que Allah (swt) primeiro menciona al-fawaahishah, e ele diz que este é o menor dos pecados que Ele menciona. Depois, Ele menciona os pecados que são contra a verdade; este é o pecado maior e é citado em primeiro lugar por Allah.
E, em seguida, Ele falou do shirk e, por último, dizer coisas sobre Allah (swt) sem que se tenha conhecimento. Ele está dizendo que Allah (swt) vai do menor para o maior. E a razão para isto é que este último pecado, falar de Allah (swt) sem 'ilm, é o que cometemos quando fazemos tafseer sem conhecimento dos antecedentes, sem uma metodologia adequada. Ele diz que envolve e inclui muito mais coisas do que simplesmente cometer shirk. Ele diz que envolve e inclui:
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atribuir falsamente algo a Allah (swt)
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modificar ou alterar a religião de Allah (swt)
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negar o que Ele confirmou ou
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confirmar o que Ele negou
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afirmar alguma coisa que foi declarada falsa ou
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declarar algo que é falso como verdadeiro e isto também inclui
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apoiar algo que Allah (swt) não gosta ou se opõe e
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gostar de algo que Allah (swt) não gosta.
Em outras palavras, quando falamos sobre a religião sem 'ilm, sobre coisas relacionadas à religião, então, na verdade, estamos modificando a religião de Allah (swt). E, de fato, se prosseguirmos com o que ele escreveu, veremos que, de fato, falar sem 'ilm é a verdadeira fonte de todo kufr e shirk.
Ele disse, por exemplo, que os politeístas alegam que o que eles adoram, ao invés de Allah (swt), é algo que os torna mais próximos de Allah (swt), assim, a causa do shirk praticado por eles seria dizer algo sobre Allah (swt) sem 'ilm, dizer algo que não conhecem sobre Allah (swt).
Da mesma forma, hoje, o maior kufr que presenciamos atualmente entre os muçulmanos, mas principalmente entre os não muçulmanos, é o secularismo, e a base para isto é dizer que Allah (swt) não cuida do que fazemos em questões mundanas, ou não nos orienta sobre como devemos agir nessas questões, ou que o Din enviado por Ele não é para ser aplicado em nosso cotidiano; tudo isto é falar de Allah sem o devido conhecimento.
Na verdade, trata-se de um dos maiores pecados e Ibn ul Qayyim até o considerou como o maior pecado. E ele também citou que todo bid'ah, toda inovação, também se baseia em alguma declaração que não tem amparo no Alcorão e na Sunnah. Em outras palavras, todo bid'ah também está baseado em alguma declaração que foi feita sem 'ilm.
Pensar neste ponto, sobre apenas ler o Alcorão e dizer, Eu sou um fiel, Eu sou um justo, Eu posso pegar no Alcorão e ler o Livro e alcançar seu significado, se houve pessoas na história da humanidade que poderiam ter dito isto - talvez nós aceitemos isto vindo deles - estes seriam os Companheiros do Profeta (saw), por várias razões:
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Eles foram testemunhas da revelação do Alcorão,
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Eles testemunharam os acontecimentos a que ele se refere, viveram esses eventos,
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O Alcorão foi revelado na língua árabe, a língua de seu tempo,
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Allah (swt) os escolheu para serem os Companheiros do Profeta (saw),
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e ele os descreveu como a melhor geranção.
Assim, se alguém podia alegar que tem o coração puro e uma relação íntima com Allah (swt), ou uma boa compreensão do Islam, a ponto de poder ler o Alcorão e interpretá-lo simplesmente com o que seu coração diz a ele, ou o que ele costuma chamar de ra'ee (opinião pessoal) - seriam os Sahaaba, mas se formos aos Sahaaba, veremos que o que eles compreendiam e o que eles aprenderam do Profeta (saw) era, na verdade, totalmente o oposto. O que eles aprenderam é que é absolutamente proibido falar sobre o Alcorão sem um conhecimento adequado.
E eles fizeram essas declarações. Por exemplo, Abu Bakr certa vez disse "Que terra me daria um lugar para viver e que céu me daria sombra se eu falasse sobre o Alcorão conforme minha opinião ou de alguma coisa que não tenho conhecimento." E Omar ibn al Khattab também disse, "Cuidado ao expressar sua opinião em questões religiosas." E Ibn 'Abbaas, aquele para quem o Profeta (saw) fez du'aa para que compreendesse o Alcorão, para tivesse a compreensão do Din e para que recebesse de Allah (swt) o ta'weel, isto é, a compreensão do Alcorão, também disse "Tudo o que existe para ser seguido e obedecido é o Livro de Allah e a Sunnah de Seu Mensageiro. Quem quer que faça qualquer declaração depois disto, então não sei se isto se contará entre os seus bons atos ou entre os seus pecados."
Este é o estilo de Ibn 'Abbaas, conforme mostrado em várias de suas declarações. Portanto, mesmo que o que fizemos fosse algo de bom, ainda que parecesse alguma coisa boa, nós o encontraremos entre nossos pecados. E at-Tirmidhi, em sua Sunan, disse que foi narrado de algumas pessoas de 'ilm, pessoas de saber, os Sahaaba do Profeta (saw) e outros, que eles eram muito rigorosos quando falavam sobre o Alcorão sem 'ilm.
Transcrito do tape "Usool at-Tafseer" (1/12)
Por Jamaal al-Din Zarabozo